terça-feira, 17 de julho de 2012

Estação, sensação.


 Completam-se duas mãos, mas me escorre por entre os dedos. Como um punhado de areia, que vai deixando os grãos escorregarem devagar pela pele. Vai caindo... Vai diminuindo... Cada vez menos... Cada vez menor... Grão por grão indo embora, quanto menos grão se tem, mais difícil fica de se guardar. Parece que se esconde, parece que não quer ser encontrado, e isso te faz perder a vontade de procurar.

  E você sente saudade das tardes do verão, das ondas molhando os pés, do pôr do sol de mãos dadas, do cabelo embaraçado pelo vento. E você percebe que agora já está salgado demais, frio demais, tarde demais... O verão já passou. E você percebe que precisa se revestir para suportar o frio do inverno, você percebe que as estradas estão cada vez mais escorregadias pelas gotas salgadas que não param de chover dos seus olhos, do seu céu escuro. Então você veste a sua capa e enfrenta o temporal, o frio e o vento que vem contra você. Fecha os olhos e se esforça para não ser vencia, vai seguindo passo a passo, vai na direção contrária de tudo e a capa começa a se rasgar, você começa a cansar, começa a perder o fôlego... Você precisa correr pra alcançar o verão logo a sua frente. E começa a doer, começa a molhar demais, começa a esfriar e vai ficando mais difícil, mais impossível, gotas do céu e dos olhos incomodam cada vez mais.

 E enquanto se esforça para caminhar mesmo com tantas dificuldades, você se lembra que nunca gostou do verão, você percebe que sempre evitou a praia. E começa a pensar se foi uma boa ideia se permitir viver aquilo tudo. E a perna vai ficando bamba, você sente que vai cair. O verão não chega, ele não se estica para que possa toca-lo. E você segue, com toda chuva, com todo frio, com todo vento. Você segue porque sem porquê você precisa do verão que parece não ter pressa em te aquecer, o verão que vai acontecer com ou sem você. Mas você insiste, você não consegue desistir, mesmo sem saber quanto tempo ainda vai suportar até que o verão volte.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

O que já não te importa mais


Já sentiu falta de ser o que ainda se é? Eu sinto falta de ser sua, e por isso eu escrevo cada dor que não consegui chorar. Eu escrevo cada dia que não consegui viver e cada sorriso teu que não soube como roubar. Escrevo cada beijo que precisei pedir e todo e qualquer carinho que suscitou a esperança. Escrevo aquele abraço, o único gesto que fomos capazes de realizar diante do medo do que não sabemos, ou não queremos saber.

Já precisou fugir do teu refúgio? Eu escondo as memórias debaixo do tapete do tempo. Escondo as tardes na sala da frente e os olhos esquecidos nos olhos do outro por horas a fio, e cada fio de cabelo teu que eu já conheço. Eu me alimento da dúvida de ainda sermos verdade e da incerteza de que o fim é certo. Eu me escondo de mim, porque só encontro-me em você, e já faz um tempo que não te acho mais nada.

E aí eu fico pensando o que será da minha prosa quando a minha melhor poesia for embora. Eu fico pensando qual será minha fala quando tudo for falta. Uma letra a mais, um chão a menos. Já foram as fotos, já foram os despertares de cada manhã... Então, boa noite, meu amor, porque é o que ainda nos resta.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Dezenove minutos.


  O frio atinge meus ossos, meus olhos refletem o café amargo que reservo na caneca enquanto sento na janela. Não passa gente, não passam carros, não passa a dor e não passa o frio. Seguro a caneca com as duas mãos e chego o rosto mais perto para aquecer o nariz com a fumaça do café.
                      
  Fecho os olhos. Sinto que já não sou boa em me expressar, já não sei fazer o que tanto amo. Talvez eu já não saiba amar ou o que amar ao certo. Encosto a cabeça na parede e encolho as pernas. O que fazer quando precisamos fugir do lugar onde nos refugiamos? O que fazer quando sua fortaleza começa a ser seu ponto fraco? Deixa a lágrima cair, deixa bater no vidro como a chuva que vem chorar como companheira. Talvez eu não esteja tão só.

  Abaixo o rosto, chego mais perto, mas o café agora não me é tão interessante, já está ficando como eu: frio e precisando de mais doce. Pinga a lágrima na caneca pra salgar de vez. Largo ela de lado. Abraço a perna e fecho os olhos com força, forço o rosto contra os joelhos. Tem vezes que os sentimentos doem, sabe? Dor física mesmo, dor de escorrer pelo rosto e fazer soluçar. Tem vezes que a boca não sabe soltar o que o coração não agüenta mais prender. Daí a gente conversa com silêncio, escuta a chuva e chora baixinho pra ninguém escutar.

  Fico de olhos fechados mais um pouco, faz bem olhar pra dentro da gente. Deixo o coração retomar o fôlego e limpo a chuva dos meus olhos com a manga do casaco. Dou um nó no cabelo, coloco meu pé com meias no chão e vou pra cama sonhar com um amanhã melhor. Mas antes, pego a caneca e ponho no lugar o qual ela pertence. Ninguém merece ficar sozinha largada na sala. Nem ela, nem eu.

terça-feira, 13 de março de 2012

Ás claras.

Quebrei o despertador do relógio, briguei com os ponteiros cansados que giraram doze, depois vinte e quatro e depois mais de trezentas horas sem permitir um só despertar. Foi uma longa noite. Talvez a mais longa de nossa curta vida. Parece que as coisas não acontecem mesmo quando nós queremos - talvez eu agora entenda.

Dizem que a noite maquia os defeitos. Em verdade eu digo: foi preciso despertar para encontrar o sonho por qual a noite toda eu esperei. Foi preciso que a luz do dia mostrasse as manchas do rosto e que aparecessem os pés de galinha no canto dos olhos – já percebeu que eles aparecem quando queremos proteger os olhos da luz, ou quando sorrimos? Vai ver que ser feliz é mesmo a melhor forma de se proteger de tudo.

Meu amor, enfim brilhou teu sorriso. Enfim teu beijo devolveu-me energia, teus olhos devolveram-me a luz e teu abraço devolveu-me o calor. Devolvi-me a você, que me tem por direito. Parei de lutar e voltei a ganhar o teu amor, que sempre quis que fosse meu, que sempre quis que fosse eu.

Sente o cheiro de misto quente e suco na cama, ouve os pássaros e aquele rádio com a pilha fraca, que tanto procuramos até encontrar. Ah, doce amor, não precisamos mais procurar, eu não preciso procurar mais nada. Eis que tenho tudo o que preciso em você esta manhã.

Espreguiça-te, meu bem, respira fundo o ar d’aurora, de agora que a pedra se foi, nós conseguimos salvar o que julgavam já estar enterrado. Lembra que chorei? Lembra como cansou essa noite sem fim, esse céu sem estrelas? Estava tão desacreditada, que se uma estrela cadente cruzasse nosso céu, eu temeria que o meteorito causasse um estrago no nosso mundo, destruindo-o de vez, e até me esqueceria de fazer meu desejo.

Ele cuidou de nós, meu menino, cuidou dos que Ele tanto ama. Cuidou para que não houvesse meteoritos para eu desejar, porque meteoritos não podem me ouvir. Você pode me ouvir agora, Sonho Bom? Pode ouvir que descobri que não há noite eterna, e que as gotas de lágrimas repetidamente batendo na pedra, fizeram-na quebrar? Estou livre para dar-te a mão, não há medo ou escuridão a nos prender. Estamos livres para estar juntos, meu amor, estamos libertos do que nos assombrava! Shhhhhhhh... Não acorda, não acorda agora, não, não acorda nunca mais. Agora que aprendemos que esconder defeitos cansa muito, vamos sonhar juntos, de olhos bem abertos e sorrisos escancarados pelo resto dos nossos "hoje", por cada dia, porque é claro que às claras tudo vai ficar muito melhor.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Diante dos ensejos, desejos!

Que o arrependimento não nos mate e que o morrer-de-amor mantenha-se bem vivo em nós. Que sorrisos não solem em meio ao calor das provações e que nenhum dia frio esfrie o calor em nossos corações. Que dias de dores passem como horas, e que a nossa hora de amar exista todos os dias, todas as noites, quando chegarmos em casa. Que nosso amor vá além do material para que, um dia, sejamos capazes de materializá-lo, seja um menino ou uma menina, a única com quem divido meu amor, com quem divido você sem ciúmes, sem bico. Que bicos sejam apenas pedidos de beijos, e que deles nunca cansemo-nos, mas permaneçamos a descobrir mil formas de reinventá-los.

Que as pessoas não sejam tão importantes, e que ser bom um para o outro nos consuma muito tempo para não tornarmo-nos bons demais para nós dois. Que não nos importemos com ninguém mais que com nós dois e que o nosso silêncio cale aqueles que falam demais. Que não importemo-nos com o que vão pensar de nós, mas com o que nós dois sabemos ao nosso respeito.

Que a saudade seja instantânea, que sintamos falta um do outro ao fim do beijo de despedida, e que nunca haja uma despedida de verdade. Que os sonhos sejam sérios e cheios de graça, que os tempos ainda sejam como os velhos, mas melhorem com o passar dos anos. Que tudo valha à pena, que tudo seja ultrapassável, e que os tropeços se tornem cada vez menos constantes e que conheçamo-nos um ao outro cada dia mais.

Que haja amor, que haja paixão, que haja uma overdose de compaixão e paciência, porque sempre haverá o tempo ruim. Entendamos que vamos errar de vez em quando e precisaremos aprender a lidar com a imperfeição do outro, porque a recíproca é verdadeira.

Que haja respeito. Respeito pelas opiniões, pelos sentimentos, pelos dias ruins e pelos momentos que precisam ser respeitados. Que haja respeito de um pelo outro, da dor de um pelo amor do outro, respeito mútuo pelo nosso amor. Que sejamos sempre a prioridade e que isso não seja uma escolha nossa ou uma regra de relacionamentos, mas simplesmente a conseqüência do valor que atribuímos a nós.

Que em momentos ruins, sejamos capazes de lembrar-nos dos dias bons e acreditar que, se nos esforçarmos, eles logo voltarão, ainda que não sejam eternos. Percebamos que é preciso perder para ganhar, então que percamos o orgulho e a vaidade, para ganharmos todo o amor e a intimidade que nos cabe.

E, como dizia Caio Fernando, “que seja doce”! Que seja doce e que seja dócil, que seja sincero, que seja verdade. Que não seja sacrifício, mas esforço, porque acreditamos valer a pena, e é isso que eu peço todos os dias: que valhamos a pena sempre!