domingo, 14 de junho de 2009

Viva a vida!

Existe um porto velho e esquecido ao sul. Ontem fui a esse porto,sentei me para ver o pôr-do-sol e,olhando aquele céu alaranjado e de gosto doce,comecei a pensar no passado,e voltar aos lugares,as pessoas,aos princípios.


Lembrei-me da minha infância,das noites que ouvia mamãe,depois de brigar com papai,chorar baixinho em um canto. Lembrei de quantas e quantas vezes eu prometi pra mim mesma que eu não cometeria aqueles mesmos erros. Com doze anos meus pais se separaram porque minha mãe descobriu um de muitos casos de papai. Daí minha mãe entrou em depressão profunda que a acompanhou até sua morte quatro anos depois,se suicidou após ver papai morto. Comecei a passear pela minha juventude, comecei a observar marcas da infância,feridas tão profundas que nunca se fecharam por completo,nunca cicatrizaram..observei que criei medo de tudo e desconfiança de todos,que nunca ‘andei’ de verdade com medo de ‘pisar em falso’ e tropeçar. Mesmo assim,tropecei. Quantas e quantas vezes caí e,assim,aprendi a me levantar sozinha. Sozinha: assim eu passei grande parte da minha vida,até conhecer o Augusto. Ah,o Augusto! O Augusto veio como um furacão,me confundiu a cabeça e me encorajou a fazer loucuras inimagináveis. Foram dias divertidos,os mais divertidos que já vivi.


Aos vinte e três anos casei com Januário, o homem mais bondoso deste mundo. Ninguém jamais me amou como Januário, nem mesmo Augusto. Eu nunca o amei. Por mais que me esforçasse, era em Augusto que eu pensava, era com Augusto com quem queria estar. Eu não podia, Augusto sempre foi errado de mais pra mim,Januário era homem pra casar. Por isso, quando me casei resolvi me desligar completamente de Augusto e viver só para Januário.


Sete anos após meu casamento, não aguentava mais viver com Januário. Ele era um bom marido, era o marido perfeito, mas eu não o amava. Eu me esforçava, de verdade, mas não se manda no coração. Foi então que me separei do Januário e fui procurar Augusto. Procurei Augusto pelos quatro cantos do mundo e prometi para mim mesma que não desistiria enquanto não o encontrasse. Sim, eu o encontrei. Lindo como sempre, bem sucedido, casado e com uma filha menina linda. Não tinha minha mãe,não tinha meu pai,não tinha Augusto,não tinha Januário..estava mais uma vez sozinha.


Foi então que mergulhei de cabeça no trabalho. Passei os últimos trinta e três anos assim: de casa para o trabalho,do trabalho para a casa. Há uns oito meses recebi um telefonema. Não era o cartão atrasado,o banco oferecendo um empréstimo, nem mesmo engano..era Augusto. Meu coração bateu acelerado,como nos meus dezessete anos,minhas mãos ficaram geladas e perdi a voz por uns instantes. Custei para acreditar. Era ele mesmo,aquela voz ainda era música aos meus ouvidos,aquela risada ainda me fazia acreditar no impossível.


Eu sempre soube que ele era a pessoa errada mais certa para mim. Aceitei o seu convite e fomos tomar café para contar sobre nossas vidas. Naquele dia,soube que Augusto havia voltado para mim,havia voltado para onde ele nunca realmente saiu.


Hoje eu vejo quanto tempo eu perdi,eu vejo que,embora viva,eu já não estava vivendo..Augusto me devolveu a vida,me fez viver em oito meses o que não vivi oito anos,o que não vivi a vida inteira.


Ali,naquele porto quieto,eu agradeci por mais um dia de vida,por mais um dia ao lado de Augusto,por mais um dia bem aproveitado.

2 comentários:

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